segunda-feira, 19 de dezembro de 2016

O amor renascentista e sua representação na pintura

O amor renascentista [1] e sua representação na pintura

Quando levamos em conta a produção de arte no que tange a pintura no período Renascentista, é perceptível o que Luhmann chama de ‘amor como meio de comunicação’[2]. Além de, é claro, continuarmos a ver a construção do amor em relação ao que é percebido como construção social do amor atribuído ao século 16, principalmente o que se chama de ‘a maneira petrarquista’ na literatura.
            Para Luhmann, por conta do amor como meio de comunicação, instaurado no contexto renascentista, fazia com que os cidadãos da época se tornassem cientes do que era o amor como paixão, e que, esse amor e seu achado, podia ser parte ou não do destino de alguém [3]. A ideia de que algo é parte ou não do destino de alguém, e desse destino não há escapatória, já fazia parte do sistema de crenças dos pensadores clássicos, e, como sabido, diversos aspectos culturais dos Gregos e Latinos é retomado durante o Renascimento, mesmo que com novos ares.
            Dentre diversos exemplos, podemos notar como o amor não correspondido era exaltado [4]. Como na obra apresentada abaixo, Vênus e o Tocador de Alaúde, de autoria de Ticiano Vecellio, datada de 1565-70 [5].

Vênus e o Tocador de Alaúde. Ticiano Vecellio, 1565-70

            É possível, através da análise do quadro, termos a percepção de Vênus, que está sendo coroada pelo Cupido, ignora o Tocador de Alaúde, mesmo esse direcionando seus atos a ela. Porém, tal representação pode vir a simbolizar o que Luhmann descreve como assimetria dentro da relação amorosa [6]. Vênus, até esse ponto, é exaltada, experienciando [7] o amor (o que pode ser representado pela figura do Cupido) ao passo que o Tocador de Alaúde atua [8] o amor em si.
            Decerto, o exposto acima é passível de ser notado no quadro abaixo, Vênus e Adônis, pintado por Giorgio Ghisi, baseado em Teodoro Ghisi, datado de 1570 [9].

Vênus e Adônis. Giorgio Ghisi (baseado em Teodoro Ghisi), 1570 

            O quadro, novamente, nos oferece a visão de quem atua, Vênus, e de quem experiencia, Adônis. Porém, nesse momento notamos as posições tomadas pelos Cupidos, no qual um, mais a parte inferior da tela agride um animal, e outro, na parte mais superior, desvela a floresta. A narrativa de Ovídio sobre a lenda de Vênus e Ovídio conta que, ao ser atingida por uma flecha do Cupido, Vênus se apaixona por Adônis e o alerta para não sair à caça. Adônis, porém, ignora o conselho de Vênus e acaba sendo morto por um javali. Podemos então relacionar esse simbolismo imagético ao que Luhmann diz em relação à comunicação explicita e relações amorosas: Essas podem ser prejudicadas por aquelas [10].
            Por fim, na obra apresentada a seguir, pintada por Sandro Botticelli, nomeada Vênus e Marte, datada de 1485, é possível notar a não presença do controle social, mencionada por Luhmann [11].

Vênus e Marte. Sandro Botticelli, 1485.

            A presença dos Faunos, ao fundo dos dois amantes, brincando com as armas de Marte, faz com tenhamos a percepção de que o rigor do controle social já não está presente onde o casal se encontra. É possível também especular que, como os Faunos brincam com as armas do Deus da Guerra, os dois amantes já não estão mais percebendo o que os está cercando, estando apenas concentrados em si mesmos.
            Olhando para todos os quadros, principalmente os dois primeiros, podemos perceber que a noção de amor que perpassa o Renascimento incide igualmente sobre a pintura e sobre a literatura. Aquilo que é dito como característico da maneira petrarquista, a paradoxalidade do amor petrarquista é percebido na representação do amor nos quadros apresentados. É contundente a diferença entre os dois amantes que, além de um atuar e outro experienciar, possuem diferenças físicas notáveis, como a presença ou não de roupas, a posição em que estão posicionados em relação ao observador da obra, assim como suas posturas corporais.

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[1] Referência Básica: LUHMANN, Niklas. Love as passion: The codification of intimacy. Harvard University Press, 1986.
[2] LUHMANN, p. 20
[3] LUHMANN, p. 20
[4] LUHMANN, p. 20
[5] VECELLIO, Ticiano. Vênus e o Tocador de Alaúde. Disponível em: http://www.metmuseum.org/art/collection/search/437827
[6] LUHMANN, p. 22
[7] LUHMANN, p. 22
[8] LUHMANN, p. 23
[9] GHISI, Giorgio. Vênus e Adônis. Disponível em: http://www.metmuseum.org/toah/works-of-art/53.522.28/
[10] LUHMANN, p. 25
[11] BOTTICELLI, Sandro. Vênus e Marte. Disponível em: https://www.nationalgallery.org.uk/paintings/sandro-botticelli-venus-and-mars

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